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segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

O Movimento Pedagógico Latinoamericano cresce na disputa por uma educação pública de conteúdo popular e democrático

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III Encontro do Movimento Pedagógico Latinoamericano
O III Encontro do Movimento Pedagógico Latinoamericano encerrou-se após três dias de intercâmbio, debates e palestras conforme a proposta formulada pelo Comitê Regional da Internacional da Educação para América Latina desde 2011, com o objetivo de representar um salto qualitativo do movimento sindical na formulação de políticas públicas alternativas que possam gerar uma educação libertadora para a transformação. Leia a seguir a declaração de San José, que é o documento de conclusão formulado coletivamente por reprsentantes de todo o continente e aprovado por mais de 500 participantes de 18 países e 34 sindicatos de educação da América Latina:
1. Somos educadores e educadoras, auxiliares e pessoal de apoio da educação. Somos orgulhosamente trabalhadores e trabalhadoras da educação e resolvemos aqui, em San José, Costa Rica, convocados pelo Movimento Pedagógico Latinoamericano ratificar nosso compromisso com a educação pública popular e democrática como ferramenta emancipatória dos povos.
2. O Movimento Pedagógico Latinoamericano nasce como uma proposta das organizações que integram a Internacional da Educação para América Latina, que não se define a si mesma como no âmbito exclusivamente sindical, mas como um movimento aberto e popular, orientado a convocar os diversos setores sociais. A participação no Movimento Pedagógico é uma decisão livre e consciente daqueles que acreditamos que a educação pública deve ser um instrumento de luta para a libertação de nossos povos.
3. Nesse sentido, o Movimento Pedagógico Latinoamericano se soma aos sindicatos como uma ferramenta de luta com uma perspectiva, que transcende a defesa profissional que os sindicatos exercem. Propõe um olhar mais amplo e emancipador, já que nasceu para construir novas propostas e realidades educativas que rompam com o projeto hegemônico com que os setores dominantes pretendem tutelar o trabalho docente e o modelo educativo para tornar funcionais a organização social e a reprodução das desigualdades.
4. Este é um espaço de encontro, debate e construção coletiva, decidido a representar, no campo da educação, uma visão de sociedade contraposta à que prevalece hoje no mundo pelas mãos do bloco dominante através do poder econômico, midiático, financeiro e militar.
5. A educação pública, de conteúdo popular e democrático, para nós do Movimento Pedagógico Latinoamericano, é aquela que forma com valores solidários; é aquela em que pulsa a memória de nossas lutas contra as diferentes formas de opressão sofridas ao longo da história deste continente; é aquela em que flui a música, a poesia, o olhar e os saberes, que nos remetem às raízes comuns de uma história tecida com muitas identidades, sobre as quais temos que continuar construindo a unidade estratégica dos latinoamericanos e latinoamericanas.
6. Dez anos após a rejeição histórica da ALCA na Cúpula de Mar del Plata, imbuídos dessa necessidade e conscientes das novas investidas para dominação como os Tratados de Livre Comércio (Tratados Transpacífico, TTP ou o TISA, etc), reafirmamos a Pátria Grande como uma tarefa a cumprir em contraposição às poderosas minorias dominantes, sócias do “dividir para reinar” da geopolítica da dependência com que, a partir da Casa Branca, pretenderam nos transformar no seu quintal.
7. Justamente porque não aceitamos essa condição, é que os integrantes deste Movimento estãos coesos em torno da ideia de que a educação pública tem que ser um instrumento para a emancipação dos latinoamericanos e latinoamericanas, habitantes de um continente que possui enormes riquezas, mas também enormes desigualdades.
8. A reação frente a essas desigualdades é que impulsionou a resistência popular às políticas neoliberais que deixaram como sequelas desemprego, fome e exclusão social. Em vários países do continente essas lutas fizeram nascer uma nova etapa histórica marcada por governos populares e democráticos que se distanciaram da submissão ao Consenso de Washington. Entretanto, hoje assistimos a uma ofensiva do poder que avança em nossa região a partir da derrota eleitoral das forças populares na Argentina e na ofensiva golpista com que, sob o pretexto de um processo de impeachment, quer interromper o mandato de Dilma Rousseff no Brasil. Se torna imprescindível a mobilização do movimento sindical junto com as demais forças populares para impedir que se consolidem esses cenários de retrocesso democrático que retiram de nós as conquistas sociais e o que foi alcançado no caminho rumo a unidade dos povos da América Latina.
9. Como trabalhadores e trabalhadoras da educação, percebemos o nosso compromisso com as lutas do passado recente e do presente, das quais orgulhosamente somos parte. Somos parte dos povos que conseguiram avançar e que hoje resistem aos ataques das classes dominantes na sua tentativa de deslegitimar os governos do campo democrático e popular, perseguindo os mesmos sistematicamente através dos grandes meios de comunicação que estão à seus serviços.
10. Também somos parte dos povos que ainda enfrentam governos que executam políticas que favorecem exclusivamente ao capital estrangeiro e a seus sócios locais. É nesses países da América Latina, que nossos povos lutam nas condições mais difíceis, onde as forças repressivas, oficiais ou camufladas, continuam gerando repressão, violação dos direitos humanos e crimes contra a humanidade, como o dos 43 estudantes normalistas do Estado de Guerrero, México, para os quais continuamos exigindo justiça.
11. Estes cenários são parte dos contrastes do nosso continente. Vivemos um momento crucial em que estamos diante do dilema de aprofundar as ações por mais direitos e conquistas para as maiorias populares ou ser arrastados para um período de restauração das velhas receitas neoliberais.
12. É nesse contexto que reiteramos nosso compromisso com a democratização da sociedade e do Estado. O Movimento Pedagógico desafia o poder estabelecido e a lógica das classes dominantes, a partir da elaboração coletiva do pensamento educativo e sociopolítico para a soberania e construção de sociedades igualitárias e democráticas.
13. Como defensores do que é público, rejeitamos a visão dos fundamentalistas do livre comércio que concebem as sociedades como conglomerados de indivíduos em estado de concorrência permanente entre si, condenados ao consumo, ao individualismo e a não participação.
14. A partir dessa visão mercantilista pretendem introduzir nas instituições de ensino a lógica da dualização social. Para isso promovem circuitos educacionais diferenciados. Formam as futuras elites econômicas e profissionais em instituições privadas, sem se misturar ou receber influência de qualquer tipo. Para as filhas e filhos da classe trabalhadora o que o sistema oferece é um conjunto de conteúdos que assegura sua adaptação e socialização dentro de uma lógica que lhes reserva para o futuro o papel de mão de obra eventual.
15. Nós que constituímos o Movimento Pedagógico rejeitamos esse modelo de sociedade e esse modelo de educação organizado a partir do patrão “poder aquisitivo”. Se os sistemas educativos funcionam para a estratificação social, se a educação forma seres intelectualmente incapacitados para reagir frente a exclusão ou aos modelos sociais que estigmatizam os pobres, é porque as instituições educativas e seus docentes foram submetidos à lógica dos setores dominantes.
16. Acreditamos em outro modelo de sociedade, o da inclusão social e igualdade. Por isso acreditamos também em outro modelo educativo constituído a partir da definição da educação pública como um direito social e humano. Há uma ligação profunda entre as lutas de nossos povos por sociedades mais justas e nossas lutas por uma educação para as maiorias populares.
17. Uma educação pública que recupere a memória histórica fugindo da história oficial imposta pelos setores dominantes; uma educação pública capaz de estruturar sentidos de inclusão, de integração, de desconstrução e rejeição a qualquer forma de discriminação. Uma educação pública que construa baseada na pedagogia da libertação e no pensamento crítico. Uma educação pública que afaste a condição social como algo restritivo para o direito ao conhecimento. Uma educação pública para a convivência pacífica, para a vivência da diversidade, que desafie e condene a violência de gênero, voltada para o cuidado de nossas crianças, jovens e idosos, para a preservação do meio ambiente e dos recursos naturais.
18. Esse modelo de educação popular e democrática não pode ser trabalho de tecnocratas afastados da realidade dos setores populares, nem pode ser uma graça concedida por um decreto governamental. Deve surgir do coração da sala de aula, elaborando e sistematizando a teoria que gera a prática docente no dia a dia das escolas e universidades. Um modelo de educação pública popular que seja construído a partir desse espaço fundamental de intervenção política e territorial que chamamos de “aula”. Um modelo educativo descolonizador, que reconheça o trabalho docente, tanto no que se refere a condições dignas de trabalho quanto às possibilidades de produção de conhecimentos e saberes emancipadores.
19. Nosso Movimento deve crescer a partir e juntamente com a comunidade educativa, com trabalhadores e trabalhadoras da educação que se constituam nos sujeitos sociais e sejam protagonistas da construção coletiva do projeto educativo latinoamericano. Nessa direção, reunidos no III Encontro de San José, Costa Rica, valorizamos as experiências pedagógicas de docentes de todo o continente, como uma forma de reconhecer o compromisso daqueles que se posicionam educando para formar seres livres nas escolas e universidades públicas. É desse modo que prestamos homenagem ao compromisso dos educadores e educadoras da nossa América Latina que seguem os passos de Simón Rodríguez, de Paulo Freire e de Carmen Lyra, símbolo da defesa do direito à educação na Costa Rica.
20. Próximo a completar quatro anos da criação do Movimento Pedagógico Latinoamericano inicia-se uma fase em que é necessário projetar-se em outras expressões do campo popular em busca de articulação com estudantes, trabalhadores da cidade e do campo e com os povos originários. Uma etapa em que necessitamos ampliar as redes de ação para fortalecer a luta por uma educação pública sem excluídos e de conteúdo emancipatório.
21. Portanto, o III Encontro de San José, Costa Rica, resolve:
I. Continuar as convocações para o Movimento Pedagógico Latinoamericano em cada um dos nossos países, com objetivo de somar e construir articulações com outras expressões organizadas do campo popular.
II. Convocar para o IV Encontro continental do Movimento Pedagógico Latinoamericano a ser realizado na Bolívia durante o ano de 2017.
III. Iniciar as ações para convergir em Recife, Brasil, berço de Paulo Freire, por ocasião do centenário de seu nascimento.
IV. Reafirmar nosso compromisso solidário com todos aqueles que defendem a educação nas salas de aula e nas ruas como um ato de liberdade e como um direito social inalienável.

San José, 4 de dezembro de 2015


Fonte: CNTE

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