Os professores brasileiros, que ontem
comemoraram seu dia, têm motivo para ficar de olho no Congresso nos
próximos meses. O projeto do Plano Nacional de Educação (PNE), aprovado
pela Câmara dos Deputados, deve chegar ao Senado até o fim deste mês. O
PL 8.035/10 traz metas específicas para a valorização do magistério,
como a melhoria progressiva dos salários até a equiparação com outras
categorias, o estabelecimento de prazo para criação de planos de
carreira e a execução de uma política nacional de formação para garantir
graduação e pós-graduação aos docentes da educação básica.
Com vigência de dez anos, o PNE chega em
um momento de crise do magistério. Tida como pouco atrativa,
principalmente por causa dos salários, a carreira está desvalorizada. Os
cursos superiores de licenciatura (destinados a formar docentes) estão
entre os menos procurados nos processos seletivos das universidades.
Pesquisa na Universidade de São Paulo mostrou que quase metade dos alunos de licenciatura em Física e Matemática não querem ser professores.
O problema começaria a afetar também outros países, como resultado da recente crise econômica. No início de outubro, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) emitiu um alerta sobre a "deterioração da posição dos mestres", afirmando que a crise afetou os investimentos em educação, piorando as condições de trabalho e os salários em diversas nações.
— As pessoas não percebem o ensino como uma profissão atrativa e muitos professores de fato a abandonam — afirma o diretor-geral da OIT, Guy Ryder, frisando que é necessária uma ação urgente para melhorar a posição dos professores e desenvolver políticas e estratégias destinadas a atrair e motivar as pessoas ao ensino.
Federalização
O presidente da Confederação Nacional
dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Roberto Leão, avalia que ainda há
muito a fazer para melhorar as condições de vida e de trabalho dos
professores brasileiros e, assim, tornar a profissão mais atrativa. Ele
acredita que as metas do PNE estão bem estruturadas e podem ajudar a
qualificar a educação pública de forma geral. No entanto, para fazer com
que o país saia do atraso educacional, o ponto crucial é o aumento de
recursos.
— Para que o plano tenha êxito, a grande
meta é a que estabelece investimento de 10% do PIB em educação [meta 20
do PNE]. Essa não é uma reivindicação apenas dos professores, é da
sociedade brasileira. Aí, será possível transformar em realidade o que
hoje ainda é sonho, como equiparação salarial com outras categorias.
Autor do projeto que deu origem à lei
que garante um piso nacional para o magistério e de outros projetos
relacionados, o senador Cristovam Buarque (PDT-DF) vai além. Para ele, a
única saída para garantir melhora substancial dos salários (e do ensino
como um todo) é a federalização da educação básica, em que a União
assumiria a responsabilidade pelo orçamento da educação infantil e dos
ensinos fundamental e médio, ficando a gestão a cargo dos municípios e
estados. Atualmente, apenas o ensino superior é de responsabilidade da
União.
— Para educação de qualidade, é preciso
uma trindade: bolso, cabeça e coração, com professores bem formados,
salários justos, escolas com boa infraestrutura, horário integral,
acesso às tecnologias de informação.
De acordo com Cristovam, só a União
poderia garantir os recursos necessários para promover o salto
qualitativo de que a educação básica precisa e dar equidade ao ensino
público oferecido no país, marcado por profundas desigualdades. O tema
vem sendo debatido em audiências públicas no Senado. A próxima acontece
amanhã, às 10h, na sala 15 da Ala Senador Alexandre Costa.
Para o senador Paulo Bauer (PSDB-SC), a
palavra-chave para revalorizar o magistério e qualificar o ensino, a
partir da aprovação do PNE, é gestão.
— Não basta estar previsto em lei para
que as metas do plano sejam alcançadas. É a gestão eficiente da educação
que poderá tornar as melhorias exequíveis e a carreira docente, mais
atrativa.
Na avaliação do secretário de Educação
Básica do Ministério da Educação, Cesar Callegari, o processo de
revalorização da docência já começou. "O magistério vai se transformar
em uma função pública de alta prioridade", garante.
Entre as vantagens, ele cita a
aposentadoria diferenciada (redução de cinco anos no tempo de
contribuição); piso salarial estabelecido por lei; e estabilidade, no
caso dos efetivos. As metas de formação inicial e continuada, planos de
carreira e ganho salarial, previstas no PNE, contribuiriam para essa
recuperação. O secretário acrescenta que, nos próximos 20 anos, o setor
terá forte demanda, e é provável que haja pressão pela elevação salarial
em razão disso.
— Gradativamente, o magistério vai se
transformar em carreira atrativa de novo, em boa opção profissional e de
vida. Nos próximos anos, ele recuperará o status que já teve, sobretudo
na educação básica — sustenta.
Motivação
Enquanto a revalorização da carreira não
acontece, muitos professores conseguem encontrar no aprendizado dos
alunos, em projetos inovadores ou mesmo no interesse das crianças e
adolescentes o reconhecimento e a motivação que não estão nos
contracheques ou na percepção da sociedade a respeito da docência.
— Meu maior motivador são os alunos.
Tenho vontade de vir para a escola. O sorriso deles me faz bem — diz o
professor Cleber Villa Flor, diretor do Colégio Polivalente, da rede
pública do Distrito Federal. A escola é uma das campeãs do Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) no DF.
Graduada em Pedagogia com ênfase em educação especial, a gaúcha Alessandra Klein é outra que encontra motivação no dia a dia.
— Sempre quis ser professora, desde
criança, e era triste ouvir as pessoas dizendo que essa é uma carreira
que não vale a pena. Eu acredito na profissão por acreditar que podemos
fazer diferença na vida dos alunos.
Em 2011, a crença de Alessandra foi
reconhecida nacionalmente. Ela foi uma das vencedoras do Prêmio
Professores do Brasil, instituído pelo MEC para valorizar práticas
pedagógicas bem-sucedidas no ensino público.
O trabalho premiado foi realizado na
Escola Municipal de Educação Infantil Paraíso da Criança, de Horizontina
(RS), quando Alessandra preparou sua turma para receber uma colega
surda.
A professora abordou temas como
diferenças entre pessoas e cultura e identidade dos surdos. Depois,
envolvendo toda a escola, ensinou a alunos e funcionários a língua
brasileira de sinais (Libras).
— Quando a aluna entrou, os coleguinhas disseram "oi" em libras. E ela sentiu que seria respeitada na sua língua — conta.
(Jornal do Senado) - CNTE
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