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sexta-feira, 1 de agosto de 2014

"QUEM TEM MEDO DA DEMOCRACIA?", POR THIAGO JOSÉ

Leia artigo do diretor de Comunicação da UNE sobre às ofensivas a democracia que nosso país tem sofrido
No ano de 2014 completou-se o cinquentenário do Golpe realizado pelos militares com o apoio de setores civis. Essa reação foi uma resposta à ofensiva de um pensamento progressista liderado por Jango, que queria realizar no Brasil reformas estruturais, na época chamadas de reformas de base. É importante salientar que o golpe não se deu somente da noite do dia 31 de março para a manhã de primeiro de abril. A mobilização dos setores conservadores se iniciou bem antes e o golpe – ainda que em sua fase embrionária – já era um desejo latente de setores das forças armadas e das classes dominantes, sendo gestado em um período anterior a sua consumação.
Com a reabertura democrática, conquistada com ampla mobilização social, restabelecemos as eleições diretas e uma série de direitos e garantias proibidas pela Ditadura. Entretanto, muitos vícios que se constituíram no Estado brasileiro naquele período permanecem até hoje. Um dos mais evidentes deles é a perpetuação da Doutrina de Segurança Nacional, que não se resume apenas numa lei, mas em toda uma lógica repressora que elenca um inimigo interno a ser perseguido. Isso pode ser observado pela atuação da Polícia Militar, na qual a tortura e o extermínio de jovens pobres e negros é regra em todos os estados da federação. Do mesmo modo, o oligopólio midiático formado durante essa período – a fim de dar legitimidade ao regime – constrói narrativas dos fatos alinhada aos interesses mais conservadores. Por fim, o sistema político brasileiro, mesmo com a grande vitória que representou o retorno das eleições diretas, continua blindado às aspirações populares, na qual o poder econômico domina o cenário político e a participação da sociedade civil não é valorizada.
Nos últimos dias ficou evidente como grande parte de nossas instituições ainda não amadureceram para o Estado Democrático de Direito. Durante o início do ano, três diretores da UNE foram detidos por conta de manifestações. Casos de assassinatos como de Amarildo, Cláudia, Douglas e do jovem Mateus em Sumaré (RJ) são exemplos da ação cotidiana da Polícia Militar nas periferias das grandes cidades. Ao mesmo tempo, os protestos são reprimidos com agressividade pelas forças de segurança. No episódio recente da denúncia de 26 militantes e ativistas pelo Ministério Público do Rio Janeiro, ficou clara a tentativa do Poder Judiciário em criminalizar os movimentos sociais. Como se o simples ato de protestar fosse um crime.
Diante de tudo isso, os jornais cumprem o papel conservador de tentar induzir a opinião pública para a legitimidade da ação repressiva estatal que age de forma desproporcional. Concentrada na mão de poucas famílias, facilmente estes veículos conseguem impor a impressão de que os manifestantes agem como se fossem criminosos. Desse modo, a cobertura da grande imprensa é de total desconsideração aos princípios democráticos, pois eles próprios já julgam e condenam sumariamente aqueles que não atendem seus interesses.
Atualmente há uma disputa pelos rumos da democracia no Brasil. De um lado, as ideias conservadoras evocam a defesa democrática para nega-la em sua própria essência. Iniciativas como o Plano Nacional de Direitos Humanos 3, a democratização dos meios de comunicação e o Plano Nacional de Participação Social, foram combatidas veementemente por àqueles que estão alinhados às ideias mais reacionárias. Todas essas ações, segundo eles, seriam para ferir o Estado Democrático. Mas afinal, que democracia é esta que é feita sem a participação popular? O que eles querem é construir uma democracia sem povo. O maior medo dos conservadores é o ativismo da população e a sua participação cotidiana na vida política do país.
A agenda central dos movimentos sociais hoje se relaciona com o aprofundamento do ciclo democrático iniciado com o fim da Ditadura Militar. Isso se dá a partir de maior inclusão social – porque não podemos falar de empoderamento popular com desigualdade social – e também da participação cidadã. A luta pela Reforma Política é fundamental para que se conclua a efetiva transição democrática iniciada com o fim dos anos de chumbo. Em outubro poderemos votar diretamente para escolher nossos representantes. Entretanto, as atuais regras eleitorais privilegiam aqueles que detêm maior poder econômico, gerando distorções absurdas que tem como a maior consequência a perda de representatividade. Quando vamos às ruas pedindo a redução do preço da passagem e o passe livre sabemos que muitos parlamentares tiveram suas campanhas financiadas pelas empresas vinculadas ao transporte público e, consequentemente, estão atrelados a seus interesses. Acabar com o financiamento privado nas campanhas eleitorais é um passo fundamental para que a política seja mais presente e representativa na vida do cidadão.
A próxima disputa eleitoral será acirrada. Os movimentos sociais progressistas precisam elaborar uma plataforma que aprofunde a democracia nas instituições brasileiras. A desmilitarização da polícia – a partir da formulação de uma nova política de segurança pública – a democratização dos meios de comunicação – proibindo oligopólios, fortalecendo os veículos locais, comunitários e a pluralidade de ideias – e a realização de uma Reforma Política democrática são fundamentais para o estabelecimento da plena democracia no Brasil.
*Thiago José é diretor de Comunicação da União Nacional dos Estudantes. 

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