No último dia 2, o país foi surpreendido com a notícia veiculada pelo jornal ‘O Estado de São Paulo’ mencionando a comparação feita pela ministra dos Direitos Humanos, Luislinda Valois, de sua remuneração mensal de R$ 33,7 mil à condição de trabalho escravo. Como se não bastasse a infeliz comparação, justificou ao jornal afirmando que o seu cargo impõe custos adicionais, como o de “se vestir com dignidade” e “usar maquiagem”, acreditando, portanto, ter o direito a receber ambos os salários, impenitente a ministra ainda reiterou: “todo mundo sabe que quem trabalha sem receber é escravo”.
Ocorre que a remuneração de servidores públicos é constitucionalmente limitada pelo valor do rendimento dos ministros do STF (teto do funcionalismo público, equivale hoje a R$ 33,7 mil), ou seja, nenhum servidor no país poderia ganhar mais do que esse valor. Irresignada com a situação, Luislinda apresentou pedido formal ao governo para que pudesse acumular os seus proventos de aposentadoria com a remuneração de ministra, totalizando um valor mensal de R$ 61,4 mil, argumentando que “o trabalho executado sem a correspondente contrapartida, a que se denomina remuneração, sem sombra de dúvidas, se assemelha ao trabalho escravo, o que também é rejeitado, peremptoriamente, pela legislação brasileira desde os idos de 1888 com a Lei da Abolição da Escravatura”.
Luislinda Valois deslinda, no documento, que recebe proventos enquanto desembargadora aposentada, no valor de R$ 30.471 mensais e que não obstante o salário dos ministros de Estado seja de R$ 30.934, ela recebe “somente” R$ 3.292, dada a limitação constitucional. Julga a medida (chamada de “abate teto”) como injusta e acredita que, para que seja feita justiça, o seu salário deveria totalizar R$ 61.405.
Soa até como piada para outros servidores públicos, que recebem em média R$ 3.272, conforme dados do IBGE. Considerando a premissa da ministra, concluímos que somos todos escravos, afinal o trabalhador brasileiro recebe em média R$ 2.115 e muitos ainda se sujeitam a condições de trabalho extremamente precárias e insalubres, em troca de salários inferiores a R$ 1.000, sem dispor dos mesmos luxos que a senhora ministra tem à disposição, como carro e motorista particular, viagens em aeronaves da Força Aérea Brasileira, cartão corporativo, imóvel para sua residência, dentre outros.
O mais preocupante é: mesmo diante do cenário alvorotado e atroz vivenciado hodiernamente pelo Brasil — crises política, econômica e institucional, alto índice de desemprego, crescente conservadorismo da sociedade, retrocessos e violações a direitos sociais, humanos e das minorias —, a senhora ministra de Direitos Humanos encontra tempo para redigir um documento de 207 páginas — diga-se de passagem — debochando de mais de 207 milhões de brasileiros; plangente.
*Thiago Dias é estudante de Direito na Faculdade de Direito Milton Campos, Nova Lima – MG e colunista da UJS
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