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segunda-feira, 11 de junho de 2018

#SaúdeMental: Racismo não é “mi mi mi”!

algumas semancanal. As ofensas criticavam o cabelo e a cor de pele da pequena. Há um mês, bilhetes racistas foram encontrados no banheiro da Universidade Federal do Ceará (UFC).

Preconceito racial afeta o psicológico e vida acadêmica de crianças e adolescentes;

Há algumas semanas, uma youtuber de 11 anos sofreu ataques em seu canal. As ofensas criticavam o cabelo e a cor de pele da pequena. Há um mês, bilhetes racistas foram encontrados no banheiro da Universidade Federal do Ceará (UFC).
Para o psicólogo e professor Paulo Vitor Palma Navasconi, casos individuais jamais podem ser tratados como exceções. São apenas alguns sintomas mais visíveis de relações sociais que fazem mal à saúde mental da população negra todos os dias.
“No Brasil, o preconceito racial pode ser transposto e exemplificado como um fantasma: ninguém o vê, mas ele existe”, afirma o doutorando em Psicologia.
Em entrevista ao site da UBES, o especialista explica como este “fantasma” promove sofrimento psíquico desde a idade escolar. Mas também como o próprio ambiente da escola pode contribuir para melhorar estas relações raciais que trazem sofrimento.
O fundamental, ele diz, é compreender as relações raciais como uma estrutura que organiza nossas relações sociais, culturais, econômicas, políticas e educacionais:
“Quando falamos sobre racismo, estamos falando de uma estrutura de poder que irá hierarquizar vidas, subjetividades e delegará quais vidas importam e quais vidas não importam. Que irá hierarquizar o que é belo e o que não é belo”.

Paulo Vitor Palma Navasconi é doutorando em Psicologia e Professor Universitário na FCV (Faculdade Cidade Verde), em Maringá, Paraná.

Dedica-se a estudos relacionados à raça, gênero e genocídio da população negra.

Desenvolvimento pedagógico prejudicado

Navasconi pontua que, além das diferenças socioeconômicas, o baixo desempenho dos alunos negros (veja dados aqui) se deve às práticas discriminatórias na escola, muitas vezes veladas: “Há uma estrutura de poder que legitima e corrobora para as desigualdades sociais, raciais e de gênero”.
Para ele, outro fator que contribui para que o negro sinta-se inferiorizado é o conteúdo das aulas, principalmente de história. Atualmente, quando se fala da história africana e de seus descendentes, é abordado o período escravocrata, mas nunca rompendo com a lógica racista nem ressaltando pontos positivos da identidade negra.

O psicólogo afirma que o racismo afeta o desenvolvimento interpessoal e intelectual de crianças e adolescentes negros. Há uma dificuldade em se aceitar, além do silenciamento dessas crianças, que têm que lidar com a situação como algo que faz parte de sua “condição”, aumentando o sofrimento. “Como não se odiar diante de um contexto tão cruel?”, questiona.

O papel da escola na luta contra o racismo

Como professor, Paulo Navasconi diz ser fundamental alertar e mobilizar o âmbito acadêmico para que sejam asseguradas a equidade e a igualdade étnico-racial desde a infância.
É de extrema importância que as escolas trabalhem as questões étnico-raciais, dando foco nas lutas, conquistas, avanços e contribuições que a população negra fizeram e fazem para a história.
As instituições de ensino são reguladas pela Lei 10.639/ 2003, que institui a obrigatoriedade do ensino da história e cultura afro-brasileira em sua grade curricular, mas o psicólogo e professor sinaliza que ainda há muito a ser feito:
“A negritude é lembrada nos espaços escolares apenas no Dia Da Consciência Negra. Uma questão prática, mas pouco divulgada, é que os pais podem e devem se informar acerca de como esse trabalho é realizado nas escolas de seus filhos, a fim de possibilitar cada vez mais a efetivação de uma educação antirracista”.
A UBES defende a efetivação imediata da Lei 10.639/ 2003! “A escola, como instituição do saber, principalmente nas séries iniciais, deve estabelecer e manter o diálogo com seus professores e alunos sobre todos os tipos de preconceito”, diz Bruna Santos, Diretora de Movimentos Sociais da UBES (leia depoimento abaixo).

Como os adultos podem ajudar?

Crianças e adolescentes que passam pelo preconceito racial tendem a ter uma queda em seu rendimento escolar, não ter mais vontade ir à escola, entre outros sinais que requerem observação de um adulto próximo.
O profissional alerta: “É fundamental que pais, responsáveis e educadores fiquem atentos a mudanças no comportamento e também marcas no corpo dessa criança. Muitas delas são agredidas na escola ou, até mesmo, passam a se agredir por estarem vivenciando discriminação racial”.
Dificuldade de se relacionar em grupo, de se expressar criativamente nas brincadeiras e rompantes de agressividade sem motivo aparente são também sintomas que merecem atenção da família, da escola e dos profissionais de psicologia.
“Outro fator fundamental que cabe à sociedade como um todo, mas aqui sinalizo a instituição de ensino, é o papel que ela possui de tensionar a lógica racista. Acredito que fortalecer a identidade dessa criança e intervir junto à escola e família é um caminho frutífero para uma condição psíquica mais empoderada a respeito de si mesma e na relação com os outros”, destaca Navasconi.

“Carvãozinho, cabelo de Bombril, macaca, negrinha. Era dessa forma que se referiam a mim na rua e na escola”

Depoimento da Diretora de Movimentos Sociais da UBES, Bruna Santos
Bruna Santos tem 18 anos e é estudante de pré-vestibular.
Carvãozinho, cabelo de Bombril, macaca, negrinha. Era dessa forma que se referiam a mim na rua e principalmente na escola. Apelidos que na infância não conseguia associar como práticas preconceituosas, até porque, infelizmente, em muitas escolas o racismo não é abordado e discutido.
Talvez, por esse motivo, me culpasse por ser diferente das outras pessoas. A pele diferente sempre era a minha, o cabelo diferente sempre era o meu, e não tinha ninguém para me falar que eu era normal igual aos outros, mesmo eu sendo a única criança negra na minha turma.
Meus pais, por falta de informação, não podiam amparar minhas angústias porque eles também sentiam a mesma coisa, eles também eram vítimas! Apenas sofriam junto comigo. Hoje, como militante de Movimento Estudantil e mulher negra, tento através do diálogo e ações empoderar outras pessoas que sofreram e que sofrem a mesma dor e o desamparo que sofri.
A escola, como instituição do saber, principalmente nas séries iniciais, deve estabelecer e manter o diálogo com seus professores e estudantes sobre todos os tipos de preconceito, semeando a prática do respeito ao próximo. Começando pela releitura dos livros didáticos e a forma que suas informações são transmitidas.
Desconstruir a ideia de que a população negra veio para o Brasil, citar a resistência, a luta, as conquistas e a importância desses povos para a formação social e cultural do nosso país é fundamental.
É preciso apontar os desafios que nós ainda somos submetidos a enfrentar diariamente com uma sociedade racista que nos oprime e nos mata diariamente por causa da cor da nossa pele.

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