Para professor da UFMG, uma mídia mais livre e plural é pré-requisito para qualquer mudança eleitoral
No Brasil, uma série de reformas está em
disputa no Congresso Nacional e na sociedade com o objetivo de combater
o problema da corrupção, construir um cenário político com mais
participação popular e transparência. Entre os destaques está a Reforma
Política Democrática, proposta de iniciativa popular que tem fomentado
diversas iniciativas e debates.
A forma como os brasileiros elegem seus
representantes nos parlamentos municipais, estaduais e federal tem
sido muito discutida. No dia 22 de abril, a Comissão de Constituição e
Justiça (CCJ) do Senado aprovou o projeto de lei do senador José Serra
(PSDB-SP) que institui o voto distrital para eleição dos vereadores.
O texto estabelece que municípios com
mais de 200 mil eleitores sejam divididos em distritos de acordo com o
número de cargos na Câmara Municipal. Na prática, passaria a ser eleito
apenas o candidato mais votado em cada distrito, sendo que cada bairro
elegeria apenas um vereador.
Hoje, tanto para vereadores como para
deputados, a eleição é feita pelo sistema proporcional de votação, no
qual os votos válidos vão para o partido ou coligação. É o número total
dos votos de cada agremiação que define a quantidade de vagas a que a
legenda terá direito
A UBES defende a manutenção do sistema
proporcional, desde que a lista aberta seja substituída pela lista
fechada, através da qual o partido apresenta previamente a lista
ordenada dos seus candidatos. Priorizando a disputa de ideias no
processo de eleição e fortalecendo a consolidação da democracia, o ponto
defendido pelos estudantes faz parte da Reforma Política Democrática e
Eleições Limpas, movimento encabeçado também pelas entidade estudantis,
Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e Conferência Nacional dos Bispos do
Brasil (CNBB).
Paralelamente, outras propostas estão em discussão no cenário brasileiro. Há o voto distrital misto (PEC 10/1995), de autoria do então deputado, Adhemar de Barros Filho (PPB-SP). Na proposta, os
eleitores teriam direito a dois votos: um para candidatos no distrito,
com contagem através dos votos majoritários, e um para o partido,
através do sistema proporcional em todo o estado. A regra do voto
distrital também pode ter a forma do “distritão” (PEC 54/2007),proposto pelo senador Francisco Dornelles (PP-RJ) e defendida pelo PMDB, que sugere a divisão dos estados para a eleição de deputados.
O professor Paulo Victor de Melo, do
Departamento de Ciência Política da UFMG afirma que os políticos devem
tomar cuidado com o ‘experimentismo’ na hora de fazer uma mudança no
sistema eleitoral brasileiro.
UBES: Em meio ao incessante pedido da
sociedade civil pela Reforma Política, o Senado aprovou o projeto do
voto distrital. O que pode mudar na hora de eleger os vereadores de um
município?
PROFESSOR: A principal vantagem
que os defensores do voto distrital propagam é a possibilidade de
“controle” mais próximo do eleitor devido à existência de maiores e
melhores canais de comunicação com seus representantes. Na verdade, o
que precisamos é de uma mídia mais plural e livre, capaz de retratar
todo o contexto da nossa realidade. A possibilidade de acesso às fontes
de informações diferentes e plurais é um dos pré-requisitos para uma
melhor democracia.
UBES: Se aprovado, o voto distrital
muda o sistema atual de eleição proporcional e passa a ser majoritário —
elegendo-se o candidato com maior número de votos. Os políticos que
defendem minorias ou categorias profissionais não correriam o risco de
desaparecer?
Devemos destacar neste caso os
problemas: o voto distrital tende a favorecer máquinas locais de eleição
e dificultar o acesso de minorias às cadeiras legislativas. A
desvantagem que mais salta aos olhos é a desproporcionalidade entre os
votos e as cadeiras conquistadas por um partido. Na ultima eleição para
vereadores na cidade de São Paulo, por exemplo, o candidato mais votado
em um único bairro obteve apenas 11% da votação. Caso esse padrão se
repetisse em uma eleição distrital, o vereador que obtivesse 11% dos
votos desse distrito seria o eleito, ou seja, 89% dos eleitores não
teriam votado neste vereador.
UBES: Mudar a maneira como elegemos
nossos representantes daria alguma chance de tratar um dos problemas do
sistema eleitoral brasileiro: o financiamento das empresas a campanhas
políticas?
PROFESSOR: O problema é a forma
como o financiamento empresarial da campanha é feito no Brasil.
Acredito que a melhor forma seria colocar um teto nominal [onde empresas
não podem doar além do percentual e do valor estipulado]. A política é
uma arena de influências da sociedade e empresas, todavia, o peso do
interesse não pode ser diferente em uma democracia.
UBES: Fala-se também em voto
distrital misto e até mesmo em “distritão”, que expande a proposta para
esfera executiva. O que o senhor acha?
PROFESSOR: Como disse o professor
Jairo Nicolau, cada cientista político possui a sua reforma política de
estimação. Eu tendo a acreditar que cada partido e cada político
também. Acredito que devemos entender os prós e contras de cada um
desses formatos e a partir daí pensar qual seria o melhor modelo para
ser aplicado ao Brasil. Possuímos todos os exemplos teóricos e reais
para pautar a nossa analise. Devemos tomar cuidado apenas com o
“experimentismo”. Mudanças em regras eleitorais modificam todo o sistema
político. É necessário se informar e pensar nas características
brasileiras. A aplicação dos modelos internacionais sem pensar as
características da nossa sociedade, política e cultural influenciarão no
resultado da reforma política.
Paulo Victor Melo – Doutorando em
Ciência Política no Programa de Pós Graduação em Ciência Política da
Universidade Federal de Minas Gerias (PPGCP-UFMG) e membro do Grupo
Opinião Pública, Marketing Político e Comportamento Eleitoral.
Nenhum comentário:
Postar um comentário