ZUMBI DOS PALMARES
O Brasil celebra neste sábado (20) o Dia da Consciência Negra. A morte de Zumbi dos Palmares, em 20 de novembro de 1695, é o mote para o conhecimento acerca dos problemas que afetam o cotidiano dos negros ainda hoje, mais de um século depois da abolição da escravatura.
Por isso, esse dia é uma data para reflexão de todos brasileiros. Durante o período da escravidão os negros sofreram inúmeras injustiças. E às custas do seu sofrimento nas senzalas, nos campos e nas cidades, foi erguido o que havia no Brasil daquela época. Os negros resistiram de diversas formas, nas muitas revoltas, fugas e com a formação de quilombos em várias partes do país. Assim, surgiu o Quilombo dos Palmares e o seu sonho de liberdade, que teve como principal líder Zumbi.
Veio a abolição, mudaram as relações econômicas e o modo de produção e hoje o Brasil é uma das grandes nações do mundo. No entanto, os negros continuaram em situação de desigualdade, ocupando as funções menos qualificadas no mercado de trabalho, sem acesso às terras ancestralmente ocupadas no campo, e na condição de maiores agentes e vítimas da violência nas periferias das grandes cidades. Sua luta, inspirada em Zumbi e em outros heróis negros que tombaram ao longo do caminho, precisa continuar.
"É verdade corrente que o Brasil, mesmo tendo findado formalmente seu passado escravista, com a promulgação, em 1888, da Lei Áurea, não conseguiu ainda saldar a dívida histórica com os descendentes dos homens e mulheres africanos feitos cativos ao longo de mais de três séculos. Isto porque, aos cerca de um milhão de escravos libertos naquela ocasião, assim como a seus descendentes, não foram asseguradas garantias que os livrassem das amarras econômicas, sociais e políticas que continuam a caracterizar a existência de negras e negros brasileiros até hoje", avalia o Ministro Chefe da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Eloi Ferreira de Araujo.
Segundo o coordenador geral da União de Negros pela Igualdade (UNEGRO), Edson França, a data, além de rememorar o histórico de luta do movimento negro, traz um viés importante para a sociedade: um marco de reivindicações pelo direito de usufruir a livre cidadania. "As pessoas vêm acolhendo essa data e isso é importante para fomentar discussões acerca da desigualdade e de políticas de inclusão", comenta Edson em conversa com o Estudantenet.
"Considero que o Brasil está dando um salto de qualidade em sua estrutura social e, conseqüentemente, poderá unir o povo brasileiro, se observar corretamente as implicações das políticas públicas nos campos da educação, trabalho, saúde, terra, cultura. O maior desafio para reparação do negro e da negra brasileira é o compartilhamento do poder político e econômico entre negros e brancos", complementa.
No geral, a avaliação é de que a desigualdade racial tem se amenizado nos últimos anos, embora a passos lentos. Na educação, por exemplo, há avanços em políticas afirmativas, em especial na instituição de cotas para o ingresso em universidades. Ainda sem determinação legal, uma vez que a lei específica tramita no Congresso Nacional há dez anos, a medida foi implementada em dezenas de universidades públicas e, em alguns casos, a presença de negros passou de 2% para 30% da comunidade discente.
A UNE, de um tempo para cá, tem absolvido muitas pautas que são estratégicas para o movimento negro debater com precisão essa desigualdade que ainda existe. A universidade brasileira tem ainda muito pouco negro, mas as atuais políticas públicas, como o sistema de cotas raciais e até mesmo o ProUni, vem acelerando o processo de inclusão. Nossa entidade entende isso e vem se organizando para representar esse movimento na universidade brasileira", explica Clédisson Santos Júnior, diretor de Combate ao Racismo da UNE.
A aprovação do Estatuto da Igualdade Racial também foi um grande avanço, segundo o diretor de Combate ao Racismo. Ele surge em defesa dos que sofrem preconceito e discriminação em função de sua etnia, raça e/ou cor. Para defender o principio de igualdade e responsabilizar o Estado por esta tarefa é que foi formulado, amplamente discutido e aprovado o estatuto da igualdade racial. O documento reúne um conjunto de ações e medidas especiais que, se adotadas pelo Governo Federal, irão garantir direitos fundamentais à população afro-brasileira.
O exemplo claro desse direito é o ensino da disciplina “História Geral da África e do Negro no Brasil”, que integra obrigatoriamente o currículo do ensino fundamental e médio, público e privado, bem como o reconhecimento do direito à liberdade de consciência e de crença dos afros brasileiros e da dignidade dos cultos e religiões de matriz africana praticadas no Brasil.
"Um dos principais avanços obtidos com a aprovação do estatuto da igualdade racial é de desmistificação da igualdade racial no Brasil. A partir de agora o Estado Brasileiro reconhece as desigualdades existentes nas relações raciais entre brancos e negros e cria dispositivos legais para tratar tais distorções, garantindo assim o processo de inclusão", afirma a professora Iris Amâncio, da Universidade Federal Fluminense (UFF/Letras)
Vale lembrar que durante muito tempo a questão do negro no Brasil só era lembrada na data 13 de maio, dia da assinatura da Lei Áurea, em 1888, abolindo a escravatura. Normalmente, nessa data nas escolas, as crianças negras faziam o papel de escravos e a loirinha se vestia de princesa Isabel, nada era falado sobre a resistência e as lutas dos negros, o destaque era pela ação da princesa Isabel.
Nos anos 70, com o surgimento dos Movimentos Negros, ocorreu a denúncia desse equívoco e distorção. Assim, começou uma luta para que o povo brasileiro lembrasse e conhecesse as lideranças negras e as muitas ações de resistências dos negros africanos através da história.
"Ser uma negra e um negro conscientes nos coloca nos dias atuais na condição indissociável de sermos ao mesmo tempo formuladores e militantes, cabeça e braços desse corpo que forma a militância social negra. Militância essa que já vem a séculos lutando por um Brasil melhor, justo e verdadeiramente de todos", conclui Clédisson Santos Júnior.
A passos longos: Faculdade Zumbi dos Palmares
Um dos grandes avanços também é a criação da Faculdade Zumbi dos Palmares, que tem por missão a inclusão dos afrodescendentes no ensino superior, viabilizando a integração de negros e não negros em um ambiente favorável à discussão da diversidade racial, no contexto da realidade nacional e internacional.
Trata-se da primeira faculdade idealizada por negros, tendo como foco a cultura, a história e os valores da negritude (90% dos alunos são negros auto-declarados). É a primeira e única instituição de ensino superior voltada para a inclusão do negro na América Latina. A faculdade tem, na matriz curricular de seus cursos, o cumprimento com a implantação da Lei 10.639/2003 que institui como obrigatório o ensino de História da África e Afrobrasileira em todos os níveis. Isso garante que os alunos dos diversos cursos tenham a consciência do seu protagonismo na história.
Em 2007, a instituição formou 126 alunos em Administração, na primeira formatura da Zumbi, que contou com o Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, como patrono. Ainda em 2009, a faculdade recebeu o conceito três estrelas no Guia do Estudante, da Editora Abril, pelo curso de Administração.
O campus da faculdade é um espaço aberto de discussões dos mais variados temas que levam os alunos a uma reflexão mais profunda sobre questões como cinema, livros, dança, teatro, etnia e muito mais. Fonte: UNE
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