Carlos Bem, diretor de Direitos Humanos da UEE-MG |
Confira o artigo do diretor de Direitor Humanos da UEE-MG sobre democratização da comunicação
O projeto de lei complementar 116 é um projeto que tramitou no Congresso Nacional pelo período de 5 anos com aprovação polêmica e sancionado recentemente pela presidenta Dilma Roussef, cujo objetivo é garantir a produção cultural brasileira nos conteúdos de canais de TV por assinatura. As operadoras de telefonia também podem administrar serviços disponíveis. A função do PLC 116 é garantir mais democratização dos meios de comunicação e concede à Agência Nacional de Cinema – ANCINE – a responsabilidade de regulamentação e fiscalização do cumprimento da nova lei. Com isso o PLC 116 define que cabe à ANCINE definir os horários nobres e as cotas que serão distribuídas aos canais. Cabe à ANATEL a fiscalização da atividade de distribuição. O projeto também coloca limites sobre o uso de capital estrangeiro nesses canais de comunicação.
Um dos pontos positivos da nova lei está no que convencionou chamar de “cota canal”. Trata-se de garantir 3h30 semanais de produções nacionais na grade de programação desses canais, observando que metade desse período deve ser preenchida com produção independente garantindo a produção nacional e a promoção/valorização da identidade nacional. Outro avanço importante está no fato de que a cada três canais estrangeiros de filmes, documentários, animações; um deles deve ser de responsabilidade brasileira, ou seja, programado por empresa brasileira. Esse procedimento garante uma concorrência que beneficia o mercado audiovisual nacional já que as produções nacionais competem de forma desigual com o conteúdo internacional. Com a aprovação da lei outro benefício que se espera é a maior diversidade de produção audiovisual no país, com mais oferta de canais o que diminuirá o custo da assinatura oferecida ao consumidor.
Apesar dos avanços o PLC 116 apresenta pontos polêmicos encarados como negativos por uma parcela da população. O estabelecimento de cotas é um dos pontos mais criticados pelos grupos de mídias e políticos aliados. Questiona-se o fato de o Estado impor a todo custo o conteúdo nacional na programação e o fato de os consumidores não terem a liberdade de escolher o que irão consumir. É exatamente essa intromissão do Estado na regulação das cotas que incomodou a bancada do PSDB e oposição ao governo Dilma no Congresso Nacional. Emenda apresentada pelo líder do PSDB, Senador Álvaro Dias, propunha o veto de diversos artigos do PLC 116 por entender que os mesmos contrariavam outros artigos da constituição. No seu entendimento a comunicação é uma mercadoria e, portanto, o estado – leia-se ANCINE, não teria autonomia para regular a matéria e nem definir o que é o horário nobre. Nessa linha de pensamento setores da sociedade entendem que a intromissão do Estado na regulação e o estabelecimento de cotas para obrigar a veiculação de conteúdo nacional nos canais são um retrocesso no debate da democratização das comunicações no país.
Diante do debate colocado meu entendimento é de que a comunicação precisa ser debatida de forma isenta de tendências político-partidárias e que, os parlamentares, precisam ouvir o clamor da população brasileira a respeito do tema. O PLC116 é importante vitória dos movimentos sociais organizados que buscam uma comunicação mais democrática entendendo-a como bem coletivo e, portanto, direito de todos os brasileiros e brasileiras. Ainda que represente um importante avanço, o debate da democratização e regulação da comunicação deve continuar e a aprovação do PLC116 deve ser entendida com impulsionadora para que os movimentos sociais continuem exigindo a comunicação como direito de todos.
A despeito do inegável avanço que o PLC 116 apresenta ao estabelecer as cotas e incentivar a produção cultural brasileira, garantindo mais autonomia nacional, mais respeito à identidade nacional, possibilidade de uma concorrência mais justa e, a previsão de queda nos preços das assinaturas dos canais fechados, torna-se indispensável ampliar o debate sobre a comunicação na ótica do bem coletivo e direito de todos. Assim como a saúde, educação, segurança pública, cultura, a comunicação deve ser “gratuita” e de boa qualidade e de direito à todas brasileiras e brasileiros; a comunicação deve ser pensada desta forma também. Não podemos enfraquecer o debate da necessidade de regulação da comunicação na TV aberta. Devemos considerar que nem 18% da população tem acesso a TV por assinatura.
É preciso pensar na população pobre, nos trabalhadores e trabalhadoras que não possuem condições de comprar a comunicação sendo obrigados a se contentar com canais abertos que definem sua linha editorial e conteúdo veiculado de acordo com seus interesses. A população de massa, pobre e trabalhadora não tem a oportunidade de escolher um conteúdo para assistir na TV aberta.
Sendo assim, há que se pensar e lutar pela garantia da comunicação gratuita, de qualidade, com cotas de produção cultural e democrática para todas brasileiras e brasileiros. Enquanto houver cidadãos desse Brasil que por questões socioeconômicas e culturais estão privados de utilizar o controle remoto para decidir e escolher o que assistir, não há de se bradar a conquista que supostamente temos uma comunicação verdadeiramente democrática.
Nessa linha de pensamento acredito que o PLC 116 veio tímido. Avançou, mas não chegou ao patamar que gostaria. Com uma bancada de políticos conservadores ligados aos grandes conglomerados de mídias que dominam nossas comunicações, através da propriedade cruzada, avançou pouco. É preciso lutar pela garantia de uma TV 100% nacional, gratuita e de qualidade para todos os brasileiros e brasileiras. Comunicação não deve ser entendida como mercadoria. Não pode estar restrita aos que possuem condições socioeconômicas de acesso. Ao contrário. Deve ser entendida como direito de todo pai e mãe de família. Direito de todos e todas trabalhadores, pobres, assalariados, moradores de zonas periféricas. Sem isso, não podemos dizer que estamos vivendo um avanço na democratização da comunicação no país.
Carlos Bem é estudante de Comunicação da UFSJ e Diretor de Direitos Humanos da UEE-MG
Fonte: UNE
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