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terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

REFLEXÕES SOBRE O FÓRUM SOCIAL MUNDIAL 2011

Por Márcio Dias, coordenador do Sindipetro-RN

No período de 6 a 10 de fevereiro próximo passado, estive participando do Fórum Social Mundial realizado em Dakar, capital do Senegal. Um país que até recentemente foi uma colônia da França. Estava compondo a delegação juntamente com representantes de outros SINDIPETRO´S e da Federação Única dos Petroleiros (FUP) composta por 14 companheiros e companheiras. No FSM a Federação apresentou com destaque o trabalho desenvolvido pelo Mova Brasil.

O FSM 2011 foi realizado na Universidade Cheik Anta Dioup do Senegal - a maior e mais importante da Africa Ocidental - foi o local escolhido para ser o espaço central do Fórum.

Os números de participantes do FSM não deixa dúvidas quanto a grandeza desse mega evento. Entre países, entidades, pessoas e quantidade de eventos os números impressionam porque entre outras questões demonstram a capacidade de infraestrutura para realizar o FSM e a capacidade do povo senegalês em receber com hospitalidade e respeito todos os participantes:

Marcha de abertura: 70 mil pessoas
Atividades autogestionadas: 1.200
Países participantes: 132 representando todos os continentes
Pessoas credenciadas: 75 mil

O Senegal em tempos remotos era constituído por muitos reinos que juntos formavam o Império Sudânico de Gana entre os séculos VIII e XI. No século XIV parte do atual Senegal pertenceram ao Império Mali e ao Império Songai no século XVI. Durante o século XVIII um país islâmico denominado Fonta Toro dominou o vale do rio Senegal.

No século XV os portugueses estabeleceram os primeiros contatos comerciais com o Senegal e, a partir do século XVII a França implementou sua política de colonização marcando fortemente a vida dos senegaleses. Essa situação iria durar até 1960 quando o Senegal conquistou sua independência.

A República do Senegal teve sua vida política inspirada no chamado socialismo islâmico, difundido por um conjunto de associações, escolas e jornais, de onde se destacou Léopold Sédar Senghor como o principal teorizador do sistema democrático e Presidente da República. Suas principais cidades são: Dakar - Capital com 1.998.635 de habitantes – Kaolack, M'Bour, Rufisque, Saint-Louis, Thiès, Touba e Ziguinchor. A língua oficial ainda hoje é o francês e a lingua nativa é o Wolof e o baobá é a árvore-simbolo nacional do país. O Senegal tem um povo pacifico, ordeiro, hospitaleiro e muito gentil. Sua população é composta por 98% de muçulmanos.

Realmente foi uma experiência política e de vida e tanto para todos os participantes. Jamais imaginei que pudesse chegar a conhecer a Africa. Um continente mistico, cheio de mistérios e lutas. Confesso que sempre tive vontade de ir a Africa... os filmes que já assistí... o que já lí a respeito, enfim... Essa vontade aumentou quando o presidente Lula fez a famosa visita e pediu perdão ao povo africano pelos anos e anos em que os africanos foram enviados ao nosso país e submetidos ao jugo da escravidão.

Não vislumbrava, porém, uma oportunidade como essa. Poder conhecer um pouco da Africa. Agora consegui realizar esse sonho. Essa possibilidade se concretizou através do Fórum Social Mundial 2011 e que aconteceu num momento muito particular da história africana que é, sem dúvida, a revolução que está acontecendo no Egyto e outros países de lá.

Durante o FSM pude participar de diversas atividades, mas a marcha que foi realizada pela ruas de Dacar - uma cidade enorme e com uma movimentação de obras de infraestrutura, residências impressionante e um trânsito congestionado - me emocionou bastante pela diversidade étnica, religiosa, cultural e pelas reivindicações políticas. Poder estabelecer contato desde um simples aperto de mão... um abraço... uma fotografia a troca de experiências políticas concretas com outros militantes do Brasil e de outros países é de um aprendizado sem igual.

Um momento marcante, também, foi o debate com o ex-presidente Lula e que teve a participação do presidente do Senegal Abdoulaye Wade. Lula criticou duramente o chamado Consenso de Washington e falou com muita firmeza sobre a Africa e suas potencialidades na geopolítica atual com seus mais de 800 milhões de habitantes. Lembrou que, quando presidente da República, visitou 29 países africanos e abriu 19 embaixadas brasileiras no continente e fez questão de frizar que o tratamento das potências EUA e da Europa é extremamente injusto para com a Africa e, especialmente injusto os imigrantes africanos que durante toda a história ajudaram a construir estes países. Lula é muito querido no Senegal e presenciei diversas manifestações de populares que gritavam seu nome sem parar.

Visitamos, também, um projeto social numa Village bem distante da capital Dacar. Foi nas Villages Bayakh e Mbissao. Um projeto de alfabetização apoiado por japoneses e um outro de prática de esporte que é desenvolvido por missionários brasileiros. Visitamos escolas, mesquitas e projetos de irrigação. Nessa visita tivemos contatos bem próximos com crianças, jovens, adultos e, com lideranças religiosas. No Senegal 98% da população é muçulmana praticante e nos receberam de maneira muito educada e respeitosa.

Da mesma maneira, considerei de extrema importâcia ter ido até a ilha de Gorée. A Ilha de Gorée que é também conhecida como Ilha de Goréia, localiza-se ao largo da costa do Senegal, em frente a capital Dacar e foi fundada pelos Portugueses e logo se tranformou num dos maiores centros de comércio de escravos do continente. Essa Ilha era o local de onde partiam os escravos negociados pelos mercadores de escravos e eram deportados nos chamados navios negreiros entre os séculos XV e XIX. Muitos morreram porque se negaram a serem deportados. Eram trancafiados, acorrentados e mantidos nos calabouços - uma prisão que tive a oportunidade de conhecer. Um local realmente muito triste e que produz ecos de uma história que a humanidade jamais esquecerá.

A Ilha de Gorée é um símbolo da exploração dos impérios português, francês e holandês, e porque não dizer da própria exploração humana sendo uma lição histórica para a reflexão das gerações atuais e futuras sobre a importância da Diáspora africana. Em Gorée, como me disse o guia senegalês Frank Dagba, 37 anos, um dos parceiros dos brasileiros no projeto social... "não consegui entrar na sla do pelourinho da ilha porque a atmosfera de sofrimento é muito presente... a história fala... literalmente" . Em 1978 a Ilha de Gorée foi declarada pela UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Cultura, Ciência e Educação) como Património da Humanidade.

Para além das discussões temáticas e apresentação de projetos sociais, o FSM também se constituiu num espaço dedicado a fortalecer as lutas de resistência contra o imperialismo e a exploração do capitalismo neoliberal e seus instrumentos de dominação política e ideológica, especialmente, a luta do povo africano que busca cada vez mais ter um papel destacado na geopolitica mundial. Além disso, e com muita enfase, é um espaço para propor alternativas democráticas e populares.

A partir dessa experiência mais concreta em que pude viver o FSM com mais intensidade pude perceber que o movimento sindical precisa ter uma participação mais contundente e de acordo com sua experiência acumulada ao longo de mais de um século de lutas classistas e revolucionárias.

Bem isso é um pouco do que ví e aprendi por lá. Poder compartilhar esse aprendizado com outros militantes do Brasil e de outros países é, sem dúvida, uma emoção a mais.

Quero aproveitar esse espaço para agradecer a todos os companheiros e companheiras, especialmente a categoria petroleira, pela oportunidade e, espero, com a experiência adquirida, poder contribuir politicamente com os demais movimentos sociais nas lutas do dia-a-dia por um mundo melhor.
Fonte: site da FUP.

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