Carlos Fernandes |
Algumas coisas exigem coragem para ser ditas. Outras, sentimento.
Diva Guimarães, uma mulher negra, de origem pobre, neta de escravos e aguerrida professora, nos mostrou que para sua história ser contada, ambos, coragem e sentimento, são necessários, à exaustão.
Ocorreu na Feira Literária Internacional de Paraty, mas precisamente no debate cujo tema era “A pele que habito”, sobre o racismo.
Longe de querer romantizar essa tragédia diária que é o preconceito e a discriminação racial, Diva expôs, sem dó nem piedade, para uma plateia predominantemente branca, todas as vísceras da hipocrisia histórica brasileira que ela tanto sentiu na pele, pela cor de sua pele.
Preterida pela sociedade desde sempre, a filha de lavandeira contou a todos que para sobreviver foi preciso amadurecer a partir dos 6 anos. Cruelmente apartada de sua infância, a revolta e a rebeldia ditavam os seus passos.
Inconformada com a marginalidade social que a religião, seus dogmas e suas “verdades” a impunham, Diva ousou cometer a maior desobediência social que um pobre pode vislumbrar para afrontar o Estado: Diva quis estudar.
Determinada a não perpetuar a sina de seus antepassados, a neta de escravos lutou, e ainda luta, para que as senzalas de nossa época, veladas ou não, sejam todas abolidas.
Considerada uma subversiva na escola que lecionou por encorajar crianças negras a serem melhores, Diva simplesmente se recusa a desistir. Nas suas palavras:
“Estudo até hoje porque eu quero raciocinar, eu quero saber o que estou lendo, eu quero saber o que está acontecendo com o meu país, eu quero saber o que está acontecendo comigo”.
É lindo.
Diva criou um pacto indissolúvel com a educação. Sabe que não existe outro caminho senão pelo conhecimento. Reivindica a plenos pulmões não só o seu lugar ao sol, mas o lugar ao sol de todos os negros, índios e LGBT’s que sofrem com o preconceito.
Singela, humilde e dona de uma estrutura física frágil, não sei se Diva faz ideia do poder que emana de suas palavras. Nos poucos minutos que durou o seu depoimento, uma chama de liberdade e esperança por um mundo mais justo ecoou por todo o país.
Na FLIP que homenageia o escritor Lima Barreto, outro importante subversivo de nossa literatura também de origem negra, a lição que a professora Diva Guimarães nos deu impõe a nossa obrigação de lutar incansavelmente pela dignidade humana.
Também não podemos desistir.
Em nome de todos que se emocionaram com a sua incrível história, apenas uma coisa a dizer:
Obrigado, querida professora.
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